Julho 27, 2019
Fernando Zocca
Elza Bumba, mais seca e arreganhada do que o bacalhau do armazém de secos e molhados da esquina, propriedade daquele mais cheio de moral e portentoso comerciante de Tupinambicas das Linhas, sempre teve em mente o projeto de fundar uma escola infantil.
A velhota ressequida agia assim menos pelo desejo de exercitar os seus dotes de professora primária do que pelo ciúme daquela sua cunhada que, pra garantir o pagamento das despesas do lar, conseguiu, por intermédio de um vereador amicíssimo, o cargo de monitora dum parque infantil distante.
O marido de Elza Bumba fora um comerciante frustrado. Diziam as más línguas, e também as boas, que o tal, dado ao vício do carteado, por causa da instabilidade emocional, não conseguia, de forma alguma, sair-se bem nos negócios.
- Ah, o pai dele sim. Aquele tinha tino pro comércio – categorizou, numa ocasião, a professora Creuzette Adam Olly quando o grupo de mestras deixava, depois do expediente, a escola onde ministravam aulas.
- Mas aquele tal de Renan Atto não é retardado, Creuzette? – quis saber Claudinéia, a professorazinha claudicante responsável pelo aprendizado da tabuada, das continhas de somar, subtrair, dividir e multiplicar das crianças frequentadoras da escolinha.
- Imagina que é retardado! O que é isso colega? Ele pode ser um vigarista, ladrãozinho de caixa registradora, enganador do pai e da mãe, mas retardado, garanto que não é não! – afirmou a Creuzette.
A gente tem noção de como são as cidades pequenas. Parece que todos sabem tudo de todo mundo. E o murmurar das trevas dava conta de que Elza Bumba, sem que soubesse o maridão Renan Atto, tivera de sentar-se no colo do vereador Emílio King Naldo, colega de partido do conhecidíssimo prefeito Jarbas o caquético testudo, em troca de alguns favores no serviço público.
- A condição para que os papéis saíssem sem tanta burocracia e, o mais rapidamente possível, dos órgãos municipais, foi de que Elza se acomodasse completamente nua sobre os joelhos do vereador, que fora ao encontro com uma sunga nova, especialmente adquirida antes, na casa de material esportivo do centro – informou Claudinéia.
- Sim. Isso é verdade – confirmou Creuzette – mas o chiframento do Renan Atto, que podia tudo, naquilo que o embriagava, só não se consumou porque quando Elza tirou os sapatos saltaram dois joanetes desautorizantes da maior luxúria jamais contida dentro dum vereadorzinho machoso. Emílio King Naldo desvigorou-se de tal forma que ao sair desalentadíssimo do quarto da pensão, onde mantiveram o encontro, lançou com desprezo, sobre a cama, os alvarás e autorizações de funcionamento da tão querida e desejada escola infantil da Elza Bumba.
- Diziam que o signo dele não ajudava, não é verdade, Claudinéia? – indagou Creuzette.
- Que nada amiga. O signo dele era a vagabundagem – rebateu Claudinéia. O nego não queria saber de nada com o serviço.
- Também, querida, o que esperar de quem afirmava ser a cúpula ânus saltitante? – perguntou Creuzette